Metafísica pode ser definida como uma disciplina filosófica que estuda e investiga as realidades que transcendem a experiência sensível, fornecendo fundamento a todas as ciências, que aqui conhecemos, no que se refere à essência primeira do ser. É, em verdade, a fundamentação daquilo tudo que nos é invisível e não alcançamos com nossa visão humana limitada.
Pessoas céticas e descrentes, bem como niilistas, consideram os axiomas metafísicos como inverdades ou até mesmo como bobagens, pois não são materialmente comprováveis. Porém, afirmo, toda essa descrença pode ser refutada com uma forte argumentação lógico-filosófica.
Você já conseguiu chegar, por exemplo, à fonte da fonte ou, trocando em miúdos, naquele local ou naquilo que faz surgirem as nascentes de água? Você já conseguiu chegar na fonte da fonte dos ventos? Quando cito fonte da fonte, refiro-me àquilo que não nos é visível, mas gera o que nos é visível ou perceptível [no caso dos ventos, ele somente nos é perceptível]. E assim sucessivamente, podemos fazer esse questionamento acerca de uma enorme variedade de fenômenos naturais, sobre os quais, o nosso conhecimento científico chega até um determinado ponto e para… justamente porque é nesse ponto que se apresenta o limite da ciência humana material e chega-se ao campo de domínio de uma outra ciência: a Metafísica.
Sim, porque ao contrário das conclusões de Kant, na sua Crítica da Razão Pura, afirmamos que há uma ciência por trás de tudo o que conhecemos, bem como também por trás da ciência que aqui é praticada, inclusive. Portanto, a Metafísica é uma ciência e mostraremos isso logo mais adiante.
Por conta disso que estamos expondo, Aristóteles a chamava Filosofia Primeira. O termo Metafísica foi cunhado pela primeira vez pelo seu discípulo Andrônico de Rodes, no século I a.C. Ele organizou todas as obras desse tema dando a elas esse nome, pois todas tratavam daquilo que há para além da física. Isso fez com que o filósofo estagirita passasse a ser considerado o pai da Metafísica. Mas a procura do entendimento da existência do ser e o motivo [e origem] das coisas como elas são, já faziam parte dos pontos levantados por filósofos pré-socráticos, por Platão e por muitos outros ao longo dos tempos.
A Metafísica pode ser estudada por meio de três vertentes: a Ontologia [a ciência do “ser enquanto ser”, pois engloba todas as questões que trazem significado à realidade e à nossa presença no mundo.], a Teologia [estudo sobre a existência e a relação de Deus com os homens e o mundo. Apoia-se na observação e interpretação dos fenômenos e tradições religiosas para compreensão da natureza divina] e a Gnosiologia [ramo que se debruça sobre o conhecimento humano. O seu objetivo é o entendimento em relação à origem, essência e limites desse ato cognitivo].
Porém, neste texto não nos dedicaremos a esmiuçar nenhuma dessas três partes, tão somente ao entendimento global da Filosofia Primeira ou Primeira Ciência.
Para prosseguirmos com a nossa argumentação, vamos compreender o termo ciência.
Nos dicionários podemos encontrar definições, como esta do Oxford, que nos diz ser Ciência o conhecimento atento e profundo de algo; corpo de conhecimentos sistematizados adquiridos via observação, identificação, pesquisa e explicação de determinadas categorias de fenômenos e fatos, formulados metódica e racionalmente.
Ora, ainda que alguém possa afirmar que todo esse conceito [ou definição] de ciência traz justamente o oposto do que afirmamos e diga que tal conceito está próximo daquilo que nos traz o positivismo lógico, ou seja, que só existe aquilo que é comprovável materialmente, nós refutamos, retrucando e reafirmando que tal definição de ciência concretiza e cristaliza o nosso pensamento.
Há uma ciência original, invisível aos nossos olhos, mas perfeitamente perceptível a qualquer um de nós.
Quando temos ciência de algo, estamos a par e sabemos o que está acontecendo. Realmente, esse termo está ligado ao conhecimento. Mas, temos ciência somente do que é visível, perceptível, sensível ou material?
Exercitando a autodialética
A dialética consiste em um processo de perguntas e respostas que, no seu modo dialógico, junto a um interlocutor, caminhamos na busca da verdade ou, ao menos, de um crescimento no saber para ambos ou para todos.
Na sua faceta dialético-reflexiva [ou processo autodialético], fazemos perguntas mentais a nós mesmos e buscamos respostas; não exatamente aquelas que nos agradem ou estejam firmadas em dogmas estabelecidos a partir dos mais variados motivos ou causas, mas como resultado de uma reflexão baseada em estudos e também na observação empírica das coisas, realizando, fundamentalmente, a epoché [suspensão do juízo], ou seja, retirando do processo de construção do conhecimento todo e qualquer tipo de opinião pessoal, pois, ela [a opinião] deve ser construída ao final, após uma conclusão calcada no conhecimento.
Tais ensinamentos nos foram legados por Platão e, até hoje, alguns milênios após sua partida, ainda nos são úteis como método e processo para aquisição de conhecimento.
Um exercício autodialético nos permitirá ativarmos, em nossos íntimos, um aspecto importante que vem sendo relegado por todos os céticos e niilistas. Refiro-me àquilo que costumamos definir como modo sentir. Trata-se de uma dimensão ontológica que habita o nosso ser, na sua porção metafísica e se manifesta ininterruptamente em nós.
É certo que, muitas vezes, o ente humano dá-se de costas para essa dimensão importante e a relega, como afirmamos anteriormente. Mas, desconsiderá-la é não levar em conta que a temos ativa em nós também quando sentimos sono, sede, fome, amamos, nos irritamos etc. Portanto, o modo sentir é uma porção do nosso lado ou da nossa dimensão metafísica.
Isso, por si só já nos comprova que há algo maior, anterior à matéria e primal [como nos ensinou Aristóteles] que a tudo move. Afinal, não há na Natureza recursos parciais; sentimos fome, sede, sono, nossos instintos estão ativos, mas também temos intuições captadas no tempo e no espaço que, muitas vezes, nos trazem “coisas” (informações ou direcionamentos) que até nos surpreendem.
Tudo o que sabemos, no que se refere ao além-matéria ou para além do lado material da dimensão humana, tem-nos sido trazido, historicamente, pelas religiões, por intermédio de mitos ou lendas. E tal recurso foi e ainda é muito importante para uma compreensão básica daquilo que há para além da realidade material.
E os religiosos conseguem, com muita eficácia, ativar o seu modo sentir. Conectam-se com Deus, Suas Divindades, Mestres, Anjos, Orixás etc. e conseguem realizar a sua religação pessoal por intermédio desse maravilhoso recurso colocado à nossa disposição, que é o fenômeno religioso.
Porém, cabe nas religiões, caso queiram, um tanto de Metafísica para uma compreensão de como as coisas se dão – dentro daquilo que conseguimos alcançar – a partir de uma explicação científica [advinda da Ciência Divina ou Ciência Maior].
A Umbanda já realiza esse movimento, nas últimas décadas, a partir dos ensinamentos trazidos a nós pelas obras de Rubens Saraceni. Uma enorme porção metafísica se mostra e revelações básicas acerca da Ciência Divina nos são apresentadas e ensinam que, por exemplo, os Orixás são muito mais do que “personagens” mitológicos e que as lendas, nada mais são do que uma interpretação da manifestação científica divina.
Portanto, caso você queira ativar e atinar para a sua porção metafísica pessoal, perceberá que há, na base de tudo o que pode enxergar e tocar, movimentos invisíveis, porém poderosíssimos que propiciam a movimentação de tudo o que conhecemos na matéria e que anima a vida por aqui.
Então, propomos o seguinte exercício de raciocínio:
Todo objeto de ciência é passível de movimento (seja ele animado por si próprio ou pelo seu manipulador)
Tudo o que consigo tocar, ver e alcançar é passível de movimento e é também objeto de ciência.
Há coisas que não consigo tocar, ver, alcançar, mas que são passíveis de movimento, porque assim consigo sentir.
Logo, o que há na via do sentir também é objeto de ciência.
Este exercício lógico não é um silogismo, pois não cumpre suas regras básicas (duas premissas e uma conclusão), mas é um exercício nosso bem pessoal e que possui uma alma silogística ou tem a essência de um silogismo em si.
Mais importante é que conseguimos deixar aqui um exercício que, se lido por você, repetido mentalmente e raciocinado repetidas vezes, trará conclusões bem sólidas.
Há movimento e ciência [conhecimento] anteriores a nós. Não há somente realidades e coisas reais visíveis, há também o invisível, o inefável e o sutil.
Só contestará isso quem não conseguir – ou não quiser – ativar o seu próprio modo sentir, a sua porção metafísica.
São dois lados da moeda, um material e o outro espiritual (ou metafísico). Não se pode cuidar somente de um lado desconsiderando o outro. O cuidado deve ser acurado, extremo e concomitante entre um e outro, pois são complementares.
Refiro-me ao próprio corpo, mas também ao mundo e à toda manifestação de Vida ao nosso redor, pois tudo possui uma porção metafísica que compõe um todo e que contém em si os dois lados – metafísico e material -.
A Metafísica nos permite – ainda que não realize, neste caso, uma revelação causal – trazermos até nós [ou até o nosso lado metafísico] tudo aquilo que não compreendemos, mas necessitamos, e que não alcançaremos com os nossos movimentos naturais.
Refiro-me, neste caso, como naturais, aos movimentos do espírito, pois, para a matéria tal busca seria impensável!
Para melhor compreensão, compare a velocidade do corpo [analogicamente aos movimentos materiais] com a do pensamento [analogicamente aos movimentos metafísicos ou espirituais] e entenderá o que aqui colocamos.
Porque a Metafísica é ciência original e base para todas as ciências subsequentes. Isso inclui muitas ciências que não conhecemos, pois estão fora do nosso alcance dimensional ou, até mesmo, planetário, mas também as já conhecidas e ativas nesse nosso mundo. Assim sendo, conseguimos trazer até nós os recursos sustentadores da vida que não conseguiríamos compreender, no atual estágio em que nos encontramos, mas que nos auxiliam e até permitem que mudemos de direção em determinadas situações.
Sugiro que você realize um exercício dialético-reflexivo bem intenso acerca dessa questão. Em seguida, se possível, parta para um exercício dialético-dialógico com alguém que se mostre, a você, de forma confortável para tal prática. Retire todas as concepções de ideias pré-estabelecidas e adentre de modo neutro na aquisição do conhecimento, ativando na potência máxima o seu modo sentir.
A teologia umbandista é puramente metafísica, estude-a basicamente, ao menos, e perceba.
Continuaremos, em breve, na segunda parte desse texto, buscando um mergulho mais profundo em nosso lado metafísico.
Um saravá fraterno!
André Cozta
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
Educa+Brasil. Metafísica. https://www.educamaisbrasil.com.br/enem/filosofia/metafisica. Consulta em 09ago.2024